A espiritualidade carmelitana, enraizada na tradição cristã, oferece um caminho profundo e sereno para quem busca um relacionamento mais íntimo com Deus. Inspirada pelos valores da oração, meditação e contemplação, ela convida os fiéis a encontrarem a presença divina no silêncio e na simplicidade da vida cotidiana. Este artigo explorará a essência dessa espiritualidade, destacando a vida e os ensinamentos de místicos carmelitas influentes, como Santa Teresa de Ávila, São João da Cruz e Santa Teresinha do Menino Jesus, cujas experiências e escritos continuam a iluminar a jornada espiritual de muitos cristãos ao redor do mundo.
Ao longo do tempo, a Ordem do Carmo, com suas diversas ramificações, tem “oferecido” santos para nossa Igreja. Santa Madalena de Pazzi, uma das figuras mais fascinantes da espiritualidade carmelitana, é conhecida por sua profunda vida de oração e experiências místicas intensas. Nascida em uma família nobre florentina, entrou para a Ordem do Carmo ainda jovem, onde se destacou por sua devoção fervorosa e seu amor ardente por Deus. Aqui próximo de nós, no Carmelo São José, de Três Pontas/MG, madre Tereza Margarida do Coração de Maria, possuía ares de santidade e está em processo de beatificação. Ela é conhecida por “Nossa Mãe”, pois foi a fundadora daquele Carmelo. Sua família reside em Campanha. Ao longo da história, muitos outros santos carmelitas nos guiaram e continuam nos guiando no caminho para um encontro pessoal com Deus.
Santa Tereza de Ávila, nascida Teresa Sánchez de Cepeda y Ahumada. É conhecida por Teresa, a grande, por ter iniciado uma reforma estrutural na ordem carmelita, que resultou na criação da Ordem do Carmelo Descalço. Ela viveu na Espanha, na cidade de Ávila, no século XVI, no momento em que o catolicismo passava pela provação da Reforma Protestante e, consequentemente, da Contrarreforma católica. Em sua vida espiritual, Tereza invocava com frequência Santo Agostinho e Santa Maria Madalena; com isso, leu as Confissões deste grande doutor da Igreja. E, incentivada pelo seu confessor e diretor espiritual, o padre franciscano Pedro de Alcântara (posteriormente, se tornou santo e é padroeiro do Brasil) começou a materializar seu pensamento em escritos que, posteriormente, foram publicados.
Dois de seus livros são muito conhecidos. Em “Caminho de Perfeição”, Sta. Tereza enfatiza a oração como o centro da vida espiritual, buscando uma profunda união com Deus. Ela destaca a importância da humildade e da renúncia a desejos mundanos para alcançar a verdadeira paz interior. A contemplação não se opõe à ação, mas sim a impulsiona. Teresa incentiva uma vida de virtudes, especialmente a caridade, como meio de crescimento espiritual. Sua obra também sublinha a perseverança e a confiança total na providência divina durante a jornada espiritual. Já em outro livro, “Castelo Interior”, a santa utiliza a metáfora de um castelo com sete moradas para representar a alma humana e sua jornada em direção à união com Deus. Cada morada simboliza um estágio de crescimento espiritual, com desafios e recompensas específicos. Ela enfatiza a importância da oração e da introspecção para alcançar as moradas mais internas, onde Deus reside. Teresa destaca a necessidade de humildade e autoconhecimento como fundamentais para o progresso espiritual.
Enquanto Santa Teresa reformava o ramo feminino do Carmelo, São João da Cruz reformava o ramo masculino. Não foi um período fácil para os dois santos! As ideias não eram bem aceitas pelos confrades, o que fez com que ele ficasse preso em um convento numa cela de 3m x 2m. Aprisionado, compôs os poemas que formam o livro “Cântico Espiritual”. Ele é muito conhecido por seu livro “Noite escura de uma alma”, que descreve a purificação da alma através de uma jornada de sofrimento e escuridão, necessária para alcançar a união com Deus. Ele enfatiza a importância de desapegar-se dos prazeres mundanos e enfrentar a desolação espiritual como etapas essenciais no crescimento espiritual. João da Cruz destaca a fé e a confiança em Deus mesmo nos momentos de maior angústia e solidão. Sua obra revela que essa "noite escura" é um processo transformador, que conduz à iluminação e à profunda comunhão com o divino.
E Santa Teresinha do Menino Jesus, batizada Marie-Françoise-Thérèse Martin, também chamada de Teresa de Lisieux, já é uma mística carmelita mais contemporânea. Viveu na França, na segunda metade do século XIX. Temos até fotografias de Santa Teresinha. Teresinha é chamada a santa da pequena via. Enquanto Tereza de Ávila compara a vida de oração com um castelo de várias moradas e João da Cruz diz que a alma deveria enfrentar uma noite escura de deserto para o crescimento espiritual, Terezinha nos ensina que podemos consagrar as pequenas coisas a Deus: durante rotinas diárias, como varrer uma casa, posso consagrar esse ato a Deus; posso caminhar para o trabalho e consagrar essa ida a Deus. Assim, diária e constantemente, estaria em um eterno processo de oração e de entrega. Podemos encontrar a descrição da pequena via em seu livro autobiográfico chamado “História de uma alma”.
A espiritualidade carmelitana, enriquecida pelo legado de São João da Cruz, Santa Teresa de Ávila e Santa Teresinha do Menino Jesus, oferece uma orientação valiosa para a vida cristã contemporânea. João da Cruz nos ensina sobre a "noite escura da alma" e a importância do desapego para alcançar a união com Deus. Teresa de Ávila nos convida a uma vida de oração profunda e íntima, através de seu caminho de perfeição e de suas moradas interiores. Já Teresinha, com sua "pequena via", nos mostra que a santidade pode ser alcançada através de pequenos atos de amor e de simplicidade. Juntos, esses santos carmelitas nos lembram que, mesmo em meio às complexidades da vida moderna, é possível viver uma fé profunda e transformadora, buscando sempre a presença de Deus em cada momento do nosso dia a dia.
Nossa Diocese da Campanha está em festa! Iremos receber a visita das relíquias de Santa Terezinha, que estão em peregrinação pelo Brasil, vindas diretamente de Lisieux, na França. As relíquias irão visitar a cidade de Três Pontas, no Santuário D’Ajuda e no Carmelo São José (29 e 31/07); e em Campanha, na Catedral (31/07 e 01/08). É um momento especial para toda a Igreja Particular. Se você puder, não deixe de participar em uma das duas cidades. Em Lambari, é possível encontrar uma igreja dedicada a Santa Teresinha, no bairro Pinhão Roxo. As missas acontecem todas quartas-feiras, às 19h30. Há cerca de dois anos, a comunidade, que foi agraciada com uma relíquia de primeiro grau desta doutora.
Pequena história da devoção a Nossa Senhora do Monte Carmelo
Conheça como a Virgem do Carmo se tornou conhecida
A devoção a Nossa Senhora do Carmo tem sua origem nos eremitas que habitavam o Monte Carmelo, em Haifa, Israel. Esses eremitas consagravam suas vidas a Deus, vivendo em constante oração, isolados uns dos outros no Carmelo. Tendo uma vida de oração, esses eremitas se organizaram e propuseram a constituição de uma regra, que foi sistematizada por Santo Alberto, patriarca de Jerusalém, e aprovada pelo papa Honório III, em 1226.
O Monte Carmelo também figura nas páginas da Bíblia. Está diretamente relacionado com as ações do profeta Elias contra Baal. No Monte Carmelo, o profeta Elias desafiou os profetas de Baal, demonstrando a superioridade de Deus ao fazer descer fogo do céu, consumindo o sacrifício, enquanto Baal não respondeu aos seus seguidores (você pode conferir essa passagem no primeiro livro dos Reis, capítulo 18). E no Monte Horeb, o profeta Elias foi testado a sentir a presença do Senhor: vieram furação, terremoto e fogo. Mas o Senhor não estava em nenhuma dessas manifestações. Deus se manifestou a Elias em uma leve brisa, que fez com que o profeta cobrisse o rosto (1Rs, 19, 11-13). Para os carmelitas, essa brisa é uma antecipação da presença da Virgem Maria na história da salvação.
Os carmelitas escolheram a Virgem Maria como padroeira por sua profunda devoção e conexão com a Mãe de Deus, vendo nela um modelo perfeito de vida contemplativa e de dedicação a Deus. Maria, como a "Flor do Carmelo", simboliza pureza, humildade e obediência, virtudes que os carmelitas buscam imitar em sua própria espiritualidade. Além disso, sua intercessão é considerada um poderoso auxílio nas dificuldades e desafios enfrentados pela Ordem. A escolha de Maria como padroeira fortaleceu a identidade carmelitana, unindo os membros da ordem sob sua proteção materna e espiritual.
Os eremitas do Monte Carmelo, inicialmente estabelecidos na Terra Santa, tiveram que abandonar suas moradas devido às invasões e conflitos nas Cruzadas. No início do século XIII, eles começaram a se mover para a Europa, levando consigo a espiritualidade carmelitana. A viagem foi cheia de desafios, incluindo a adaptação a novos ambientes e a necessidade de encontrar apoio entre os cristãos europeus. Apesar dessas dificuldades, os carmelitas conseguiram estabelecer novos mosteiros e comunidades.
Eles se instalaram primeiramente na Itália e na França, expandindo-se rapidamente para outros países, como Inglaterra e Espanha. Em cada novo local, enfrentaram o desafio de integrar sua vida eremítica com as tradições e culturas locais. A Ordem do Carmo se propagou pela Europa, atraindo novos membros e ganhando o apoio da Igreja. Essa expansão permitiu que a espiritualidade carmelitana florescesse, influenciando a vida religiosa e a devoção dos cristãos em todo o continente.
Os carmelitas chegaram ao Brasil no ano de 1580, quando chegaram quatro frades. Sucederam-se fundações de conventos em Santos, Angra dos Reis, Rio de Janeiro, Recife, Mogi das Cruzes e Itu. A presença carmelita no Brasil é marcada por uma forte atuação em diversas áreas, incluindo educação, pastoral e espiritualidade, com comunidades e mosteiros espalhados por várias regiões do país. Os carmelitas, no Brasil, também se dedicam à promoção da justiça social e ao apoio das comunidades mais vulneráveis.
A ordem terceira
A Ordem Terceira do Carmo surgiu como uma forma de leigos viverem a espiritualidade carmelitana enquanto permaneciam no mundo secular, fundada por São Simão Stock, no século XIII. Esta ordem é composta por homens e mulheres que, sem se tornarem monges ou freiras, se comprometem a seguir os princípios de oração, contemplação e serviço, característicos do Carmelo. A Ordem Terceira oferece aos leigos uma maneira de aprofundar sua fé e de conexão com Deus, vivendo os valores carmelitas em suas vidas diárias. Sua importância para a Igreja está na promoção de uma vida espiritual profunda entre os fiéis, fortalecendo a comunidade cristã e difundindo a espiritualidade carmelita.
O Escapulário de Nossa Senhora do Carmo
Sacramental que une o católico à espiritualidade carmelitana
O escapulário é um elemento presente em diversos hábitos religiosos. Em sua origem, é um avental que tem por objetivo proteger o hábito. Chama-se escapulário pois é preso pelos ombros, as escápulas. Com o passar do tempo, ele foi reduzindo de tamanho, por uma questão de praticidade, e chegou ao formato que temos atualmente.
Escapulário não é um amuleto que o fiel deve usar para se proteger de “mau olhado” (o famoso quebrante). É um sacramental que une o fiel à Virgem Maria. É visto como um sinal tangível, palpável, de proteção e de consagração espiritual. Ao vesti-lo, os fiéis expressam seu desejo de seguir os ensinamentos de Cristo e de Maria, Mãe da Igreja. Este pequeno tecido representa um compromisso de fé e de confiança na intercessão da Virgem, promovendo um constante lembrete da presença amorosa de Deus em suas vidas. Além de sua dimensão simbólica, o escapulário é um convite à prática da oração e à vivência dos valores cristãos, fortalecendo a espiritualidade dos que o usam com devoção.
Este devocional tem suas origens ligadas a São Simão Stock, um monge carmelita do século XIII, que é creditado por ter recebido uma visão da Virgem Maria prometendo proteção especial aos que usassem o escapulário como sinal de sua devoção. O escapulário, composto por duas pequenas peças de pano ligadas por cordões, tornou-se um símbolo popular de fé e de devoção mariana ao longo dos séculos. Inicialmente, usado pelos monges carmelitas, espalhou-se entre os fiéis como um sinal de consagração e de proteção maternal da Virgem Maria.
O privilégio sabatino, associado ao escapulário, é uma promessa especial feita pela Virgem Maria ao papa João XXII. Segundo essa promessa, aqueles que usarem o escapulário, com devoção, serão assistidos pela Virgem Maria especialmente no sábado após a morte, recebendo a graça de uma intercessão especial para sua salvação. Este privilégio sabatino reforça a crença na intercessão e na proteção contínua da Virgem Maria para aqueles que se consagram a ela através do escapulário.
Hoje, o escapulário continua sendo um símbolo de devoção mariana e um meio poderoso de expressar a fé católica. Milhões de católicos, em todo o mundo, usam o escapulário como um lembrete tangível de seu compromisso com Cristo, através da intercessão de Maria. É um testemunho vivo da crença na proteção maternal da Virgem Maria e na promessa de graça e de salvação, que acompanha aqueles que o usam com devoção sincera.
Como deve ser o escapulário
O escapulário, como já mencionado, deve ser preferencialmente de pano. Hoje em dia, é possível encontrá-lo confeccionado em diferentes materiais. Mas, ao adquiri-lo, preze sempre pelo formato original: feito de pano.
Em uma das suas faces, deve estar a estampa da Virgem do Carmo. E, na outra face, a estampa do Sagrado Coração ou o brasão da Ordem.
A criatividade do povo criou diversos “tipos” de escapulário, mas o “legítimo” é como mencionado acima.
Como receber o escapulário
Na primeira vez que o fiel recebe este sacramental, ele deve ser imposto por um sacerdote, com oração própria. Também é válido dizer que o escapulário deve ser abençoado. A imposição é feita apenas uma vez, apenas na primeira vez que o fiel receber este objeto de fé. Nas demais vezes, não há a necessidade de imposição sacerdotal. É sugerido (mas não obrigatório) que os escapulários sejam abençoados e impostos sempre no dia 16 de julho, que é o dia litúrgico dedicado a N. Sra. do Carmo (com a reforma do missal, promovida pelo papa Francisco, o dia 16/07 deixou de ser memória e deverá ser celebrado como festa em toda a Igreja Católica).
Prof. Me. Flávio Maia
Membro da PASCOM (equipes paroquial e diocesana)
Noviço da Ordem Terceira do Carmo